OXALÁ

Oxalá, também chamado de Obatalá, é o Rei da Roupa Branca ou, ainda, o Grande Orixá. O mais importante dos deuses Iorubá. Foi ele o primeiro a ser criado por Olodumaré ou Olorum (Deus Supremo), que lhe conferiu o poder de sugerir, Axé e de realizar, Axé, razão pela qual é saudado com o título de Alabalaxé. Oxalá é considerado o maior dos Orixás, tanto no Brasil quanto na África, e seus adeptos costumam utilizar colares de pontas brancas e vestirem-se, igualmente, de branco. Simboliza a paz, é o pai maior nas nações das religiões de tradição africana. É calmo, sereno, pacificador; é o criador e, portanto, é respeitado por todos os Orixás e todas as nações. A Oxalá detêm os olhos que vêem tudo.

Etimologia

“Oxalufã”, “Oxaguiã” e “Obatalá” são termos utilizados para representar o Orixá, sendo todos eles procedentes da língua iorubá.
Cuidado para não confundir o nome do Orixá Oxalá com o homônimo oxalá. Está última consiste em uma palavra da língua portuguesa utilizada como interjeição para expressar o desejo que algo aconteça, cujo sinônimo é “tomara” ou “queria Deus’.

África

Em África ele é cultuado com o nome de Obatalá. Quando os negros vieram para o Brasil como pessoas escravizadas, trouxeram consigo, além do nome do Orixá, outra maneira de referir-se a ele, Orixalá, cujo significado é “orixá dos orixás”. Numa versão contraída, o nome que se acabou popularizando, é Oxalá.

Obs: Lembre-se que na mitologia iorubá, de maneira geral, existem três principais raízes mitológicas, que apesar de serem diferentes, mantêm uma linha central.

Mito: Oxalá cria os homens

Em um dos mitos de criação, o orixá Odudua cria o mundo após Oxalá falhar na sua missão, por ter se embriagado com o emu (vinho de palma), restando a ele, o poder da criação dos seres humanos no órun (mundo espiritual) e no ayé (mundo físico), sendo este mito da criação de Oxalá a ser retratado no conto a seguir.

— Não me decepcione novamente! — disse Olorum, o deus supremo para Oxalá.

O deus do pano branco, no entanto, deu-lhe a certeza de que tudo ira ocorrer bem desta vez.

— O culpa de tudo foi daquele desgraçado do Exu! — disse o deus criador. — Ele provocou-me uma sede tão terrível, que tive de parar minha caminhada à terra para tomar um bom gole de vinho em uma palmeira.

— Chama de “Bom gole” até cair?

— Exu colocou algo enfeitiçante naquele vinho, grande deus! Foi parte da Magia!

— Chega de acusações! Agora vá e cumpra com a segunda parte do plano da criação.

— O que o senhor deseja que eu faça grande deus?

— Quero que crie os seres que irão habitar a terra. Ainda confio nos seus dotes criativos, apesar de tudo.

Oxalá partiu após o pedido de Olorum, levando na cabeça as mais diversas ideias.

“Que espécie de seres criarei?”, indagava-se em seus pensamentos, enquanto descida de Orun (Céu) pela gigantesca teia de aranha (pois tal era a estrada de que os deuses se valiam para chegar à terra).

Então, de repente, ele teve uma brilhante ideia.

— Já sei! Sendo a terra uma copia do céu, farei de suas habitantes cópias quase perfeitas dos deuses!

Oxalá, então, passou a se entregar em uma série de experimentos e graças ao auxílio de Nanã-Buruku — deusa do lodo dos fundos dos rios e dos lagos — conseguiu cair do barro o primeiro homem.

Oxalá tinha nas mãos, portanto, o primeiro protótipo humano.

— Nada mau! — dizia ele enquanto admirava a criatura toda preta como os deuses — agora, assim como há deusas e deuses, farei também uma parceira para este belo boneco!

Oxalá trabalhou arduamente e fez a contrapartida do homem.

— Você irá se chamar Mulher! — disse ele, admirando a sua Eva africana.

Assim que acabou o primeiro casal, Oxalá entregou-se à atividade exaustiva de fabricar as dezenas de cópias (pois ainda não tivera a ideia de fazê-los procriarem entre si).

Durante muitos dias, Oxalá dedicou-se a este trabalho estafante. No início, até que resistiu bem, mas depois de haver empilhado uma enorme montanha destes bonecos pretos, começou a sentir sede.

“Puxa, um bom golezinho agora cairia bem!” , pensou ele, lembrando-se do vinho fatídico.

Ao mesmo tempo, surgiu-lhe uma névoa mental, a figura severa de Olorum a dizer lhe com as sobrancelhas unidas; “Não me decepcione outra vez!”.

Oxalá voltou a concentrar-se no trabalho, mas a sede mais e mais o atormentava.

— Assim não dá! — exclamou ele, afinal, mandando às favas as caretas e as advertências.

Com a língua de fora, correu até a primeira palmeira, onde se encharcara de vinho.

— Só um golezinho! — disse ele, arregalando de tal maneira o bocão que quase engoliu a árvore.

— Muito bom! Ótimo! — exclamou ele, alisando a pança preta por debaixo do manto alvíssimo.

Então, vendo que o vinho ainda jorrava copiosamente do tronco, atirou-se a ele com fúria.

— Quem toma um gole toma cem! — disse ele, bebendo até enfarar-se.

Desta vez, porém, antes de o sono se apoderar dele, Oxalá voltou à sua ocupação.

— Desta vez, ninguém me irá ver caído por ai feito um borracho! Mãos à obra! — gritou, enterrando as mãos no barro primordial.

Animado pelo vinho, Oxalá terminou o novo boneco em uma velocidade inédita.

— Aí está! Tão perfeito quanto os outros! — comentou, atirando a nova criatura na pilha.

Entretanto, com os olhos nublados pelo vinho, não percebeu que o colocara terra demais no dorso do pobre boneco, criando-lhe uma bossa enorme nas costas. O boneco seguinte foi cair sobre a pilha com os membros tão compridos que até mesmo o deus embriagado percebeu o defeito.

— Ora só, vejam só o compridão! — disse ele. — Muito bem, estão não tem mais nenhum concerto; mas macacos me mordam se não hei de compensar no seguinte!

Motivado por uma cautela excessiva, Oxalá passou a exagerar demais no próximo, fazendo-o tão pequeno que mal chegava aos joelhos do grandalhão.

— Maldição! — disse ele, lançando-o para a pilha.

Com as mulheres não era diferente: algumas vinham com seis demais, outras com pouco, umas mancas outra até mesmo sem pernas, de tal sorte que daí para diante não surgiu mais um único boneco de ambos os sexos que não trouxesse consigo algum defeito: um nasci com nariz, outro sem olho, outro sem orelhas, sem língua — um verdadeiro exército de deficientes físicos que não apenas povoou o planeta inteiro porque o deus, exausto, adormecera outra vez.

Oxalá dormiu outra vez, ao lado das suas graciosas criações, até que despertou muito tempo depois, com a língua pastosa.

— Que pifão — disse ele, observando ao redor para analisar se havia alguma alma pro perto — Se aquele linguarudo do Odudua ver-me de novo neste estado, estarei perdido.

Então, colocando-se de pé, outra vez, fora ver o resultado do seu trabalho.

— Céus, que mostrengo é este? — disse ele, tomando nas mãos um par de gêmeos siameses, — Isto só pode ser coisa daquele crápula do Exu! Ou quem sabe, daquele invejoso do Odudua!

Sua vaidade autoral, porém, não lhe permitia assumir a responsabilidade por tais defeitos, e foi por isto que tomou da pilha os melhores exemplares e os levou até o deus supremo, para dar conta do seu trabalho.

Chegando lá, teve a desagradável surpresa de encontrar empilhados, ao lado do trono de Olorum, algumas as piores aberrações saídas das suas mãos.

— São esses os seres que irão povoas o Aiê? — perguntou Olorum, com uma carranca terrível.

Desgraçadamente, como bem podia ver o pobre deus oleiro, Odudua — auxiliado, decerto, por aquele miserável do Exu! — já havia a má nova para o deus supremo.

Felizmente, ele trouxera consigo alguns exemplares perfeitos e após mostrá-los, viu a ira de Olorum decrescer consideravelmente.

— Hum...Gostei desses! — disse Olorum.

— E estes! São perfeitamente atletas! — acrescentou Oxalá, mostrando outros bonecos masculinos.

Porém, Olorum ficara mais impressionado com as bonecas.

— Definitivamente, muito me agradam! — disse ele, reservando três ou quatro para si.

Então, para não acharem que estava afrouxando na sua autoridade, determinou uma punição ao deus do pano branco: além de renovar-lhe a proibição do consumo do vinho amaldiçoado, decretou que Oxalá deveria tornar-se protetor especial de todos os seres humanos que nascessem com deformidades.

E aqui termina um dos mitos da criação, uma das tantas lendas africanas que tentam explicar as razões dos deuses terem decidido criar, certo dia, na terra, uma cópia desastrada de Orun (Céu) e dos seus felizes habitantes

Baseado no Livro: As melhores histórias da Mitologia Africana.